Obreiros operam milagres na liberação de recursos de emendas parlamentares, milhões foram liberados para a Prefeitura de Bom Lugar, na base do dizimo da propina ou mesmo o PIX transferência da moda é na hora é na cara do freguês
Prefeita de Bom Lugar obteve liberação de R$ 5 milhões via gabinete de pastores no MEC
Marlene Miranda, de Bom Lugar; Júnior Garimpeiro, de Centro Novo; Nelene Gomes, de Amapá do Maranhão e Fernando Pessoa, de Tuntum, são os prefeitos citados como beneficiados.
O gabinete paralelo formado por pastores no Ministério da Educação tem obtido uma taxa de agilidade na liberação de verbas da pasta para municípios fora dos padrões de repasses federais. Desde o começo do ano passado, os religiosos Gilmar Santos e Arilton Moura, que, como revelou o Estadão, controlam a agenda do ministro Milton Ribeiro, intermediaram encontros de prefeitos no MEC que resultaram em pagamentos e empenhos (reserva de valores) de R$ 9,7 milhões dias ou semanas após promoverem as agendas. Em um dos casos, uma prefeitura conseguiu o empenho de parte do dinheiro pleiteado apenas 16 dias depois do encontro mediado pelos religiosos. Só em dezembro foram firmados termos de compromisso, uma etapa anterior ao contrato, entre o Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE) e nove prefeituras, de R$ 105 milhões após reuniões com os pastores.
Ao menos 48 municípios foram contemplados após encontros com pastores entre os primeiros meses de 2021 até agora, sendo 26 deles com recursos próprios do FNDE – o restante recebeu dinheiro de emendas do orçamento secreto.
A prefeita Marlene Miranda, de Bom Lugar (MA), teve o pedido de dinheiro atendido em apenas 16 dias, prazo fora dos padrões da distribuição de recursos federais. Em 16 de fevereiro, ela esteve no MEC acompanhada do marido, o ex-prefeito Marcos Miranda, numa agenda intermediada pelos religiosos Gilmar Santos e Arilton Moura. No último dia 4, o FNDE reservou R$ 200 mil para pagamento à prefeitura. O recurso foi destinado para a construção de uma escola de educação infantil, obra estimada pelo município em R$ 5 milhões. Procurada, a prefeita não quis comentar.
RAPIDEZ
Tal celeridade não é usual na liberação dos recursos. Não é raro que um pagamento caia na rubrica de “restos a pagar” e demore anos para ser quitado. Em 2021, por exemplo, o FNDE quitou um empenho de R$ 198,7 mil destinado à Secretaria de Educação de Pernambuco cuja data original era de novembro de 2012, quase dez anos antes. Dos recursos empenhados, a maior parte (R$ 5,2 milhões) foi para a rubrica orçamentária de “apoio à infraestrutura para a educação básica”, que inclui a construção de creches e escolas. Também foram liberados recursos para a compra de ônibus escolares e para a construção ou reforma de quadras de esportes, além da compra de materiais didáticos.
Outro caso de liberação célere de recursos ocorreu em Centro Novo do Maranhão. Em maio passado, o pastor Gilmar Santos levou o ministro da Educação na cidade de 22 mil habitantes. Noventa e seis dias depois, em 18 de agosto, o ministério empenhou R$ 300 mil para a construção de uma escola infantil. Na ocasião da visita, o pastor deixou claro seu papel no evento: “Estamos levando aos municípios os recursos”. Advogados dizem que os religiosos podem ter incorrido no crime de usurpação de função pública, punível com até dois anos de prisão, por não terem cargo no ministério, mandato parlamentar ou ligação com o setor de ensino. Em encontros promovidos com os dois pastores, o ministro da Educação, Milton Ribeiro, já declarou que prefere fazer o contato com os prefeitos sem a intermediação de parlamentares.
OBRAS
Também em agosto, a cidade de Amapá do Maranhão recebeu o empenho de R$ 300 mil para a construção de uma escola de educação básica. Três meses antes, a prefeita esteve em Brasília para uma visita ao ministro da Educação – novamente, com a presença de Gilmar e Arilton.
Procurados, os religiosos admitiram que levam prefeitos ao gabinete de Milton Ribeiro, mas não explicaram por que participam de reuniões onde são discutidas liberações de recursos. Disseram que não pedem contrapartida pelo acesso ao ministro e que fazem isso porque são “homens de Deus”. “Nunca houve (contrapartida)”, disse Gilmar. Arilton alegou que nunca participou de reunião sobre obras, embora conste de agenda do MEC. O ministério não comentou. A REVISTA VEJA TRAS MAIS INFORMAÇÕES SOBRE A FARRA DOS PASTORES DO MEC